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Design Racional de Medicamentos: Aplicações de métodos físicos e computacionais na compreensão da estrutura das proteínas


Para que um medicamento desempenhe corretamente suas funções, é necessário que ocorra a interação entre ele e os receptores presentes no organismo humano. Sob tal ótica, pode-se concluir que, para desenvolver um medicamento seguro e eficaz, é necessário compreender de que forma se dão essas interações, o que só é possível a partir da compreensão de propriedades físico-químicas associadas ao medicamento e a seus receptores.   



O processo de produção de medicamentos e insumos farmacêuticos está associado à utilização de metodologias físicas, que reúnem princípios físicos para avaliar o desempenho de produtos e otimizar processos com base nas propriedades do sistema em análise. Tal abordagem fornece mais segurança e eficácia aos tratamentos, por prever possíveis interações, além de entender melhor a estrutura e comportamento de fármacos em contato com o organismo.  


A interação entre física, farmácia e computação tem sido uma grande ferramenta para a otimização de tratamentos de saúde e compreensão de princípios fundamentais que justificam processos biológicos. É por meio da análise de modelos computacionais que é possível conhecer a estrutura de moléculas e receptores e entender suas interações por meio de propriedades físicas, a fim de prever o desempenho farmacocinético de medicamentos em contato com o organismo, ou seja, seu percurso de biotransformação. 


Muitas metodologias físicas vêm sendo associadas ao campo de análise estrutural da bioinformática, a qual tornou-se uma ferramenta indispensável no desenvolvimento de medicamentos, por proporcionar a análise de dados biológicos por meio de métodos computacionais que otimizam o processo. Isso possibilitou a descoberta de novos alvos terapêuticos, estudos mais eficientes sobre interações medicamentosas e análises mais meticulosas acerca do design de medicamentos, avanços que trouxeram melhorias nas abordagens clínicas e terapêuticas, em função da promoção de tratamentos mais eficientes e seguros. 

A conexão entre tais áreas do conhecimento tornou possível entender como as estruturas de moléculas se relacionam com suas funções. Tratando-se de proteínas, por exemplo, a interação entre física, biologia e computação tornou possível prever estruturas de proteínas por meio de sua sequência de aminoácidos, podendo, então, elucidar suas funções biológicas. A partir dessa análise estrutural e funcional, foi possível prever possíveis interações entre essas e outras estruturas com fármacos, possibilitando o design racional dos mesmos, com base na estrutura dos alvos terapêuticos e no entendimento dos processos metabólicos que integram as vias de biotransformação dos medicamentos. Conclui-se, portanto, que a estrutura das proteínas é um ponto central no desenvolvimento de terapias medicamentosas.  


As proteínas correspondem a macromoléculas formadas por aminoácidos, cuja estrutura determina sua função, interação com outras moléculas e sua participação nos processos biológicos. Elas podem ser classificadas em primárias, quando formadas por uma sequência linear de aminoácidos, secundárias, quando possuem arranjos locais, como Hélices, Alfa e Folhas Beta, terciárias, que compreende a figuração tridimensional de uma única cadeia polipeptídica, e quaternárias, referindo-se à organização de múltiplas cadeias. 


Todas as estruturas proteicas apresentam importâncias quanto à função, estabilidade e funcionalidade da molécula, cuja compreensão é indispensável para o desenvolvimento de medicamentos, interferindo na identificação de alvos terapêuticos, desenho de medicamentos, desenvolvimento de fármacos mais específicos e eficazes, diminuição de efeitos colaterais, superação da resistência medicamentosa, compreensão e identificação de mutações e personalização de tratamentos com base nas variações genéticas individuais do paciente. 

A evolução das abordagens de avaliação estrutural possibilitou a integração de técnicas experimentais, baseadas em dados observacionais, com técnicas de modelagem computacional, as quais são baseadas em bancos de dados e algoritmos, o que possibilitou a melhor interpretação de questões biológicas.


Alguns exemplos de métodos físicos compreendem princípios ópticos e ondulatórios para a determinação de estruturas proteicas. Um deles é a Cristalografia de Raios X, baseado nos padrões de difração gerados mediante a exposição de um cristal de proteínas a raios x. Os ângulos de difração são considerados para a formação do mapa de densidade de elétrons, o qual determina a estrutura 3D da proteína. Esse método permite a obtenção de uma extensa base de dados e a identificação da estrutura atômica da proteína em alta resolução, sendo adequado para proteínas grandes e complexos proteicos. Sua aplicação se dá por meio da cristalização da proteína, o que representa uma desvantagem por ser um estado não fisiológico, que pode causar alterações na conformação natural da proteína, além de não fornecer informações sobre a mobilidade da proteína que encontra-se em um estado não funcional, por não estar associada à água. 


Por conta de suas limitações, é necessário integrar outros métodos para obter informações mais precisas e abrangentes sobre a conformação de proteínas. Por isso, outros métodos físicos, como ressonância magnética nuclear e criomicroscopia eletrônica são incorporados. Apesar disso, todos os métodos possuem suas limitações e desvantagens, sendo necessário analisar a eficácia mediante suas aplicações, considerando o tamanho das proteínas e a resolução que cada método oferece. 


Buscando tornar a pesquisa de medicamentos mais eficiente, a partir da simulação do comportamento de moléculas complexas, tais como proteínas e ligantes, surge a modelagem computacional, a qual não requer a experimentação direta, mas baseia se em cálculos matemáticos e incorporação de softwares e algoritmos especializados, criando representações virtuais de sistemas biológicos conhecidos e prevendo estruturas de biomoléculas, possibilitando o design de novos medicamentos. 


Um dos tipos mais conhecidos de modelagem computacional é o Docking Molecular, o qual é utilizado para prever interações físicas entre duas moléculas, especificamente entre uma proteína e seu ligante, que pode, inclusive, ser um fármaco. Essas interações podem ser hidrofóbicas, iônicas ou pontes de hidrogênio. O algoritmo do docking avalia as conformações possíveis com base em sua energia de interação, que compreende a medida de energia potencial do sistema mediante a interação das moléculas, considerando as forças intermoleculares, ou seja, avalia quantidade de energia necessária para que ocorra a ligação entre duas moléculas, determinando se a interação será ou não estável.  A partir disso, é possível determinar ajustes nas estruturas químicas dos compostos, com o objetivo de otimizar essas ligações. 


Apesar de representar uma abordagem revolucionária, a modelagem computacional ainda possui limitações, por conta da simplicidade do modelo fornecido, o qual não é capaz de considerar todas as propriedades biológicas das moléculas e suas características dinâmicas, além de apresentar certa restrição para proteínas sem homologia conhecida, por funcionar mediante base de dados. 



Dessa forma, pode-se perceber que a integração entre métodos físicos e computacionais, sob uma ótica generalizada, fornece resultados mais completos e eficientes do que a utilização de métodos isolados. A associação do docking molecular e da cristalografia, por exemplo, é uma abordagem complementar muito rica, haja vista que a cristalografia pode fornecer dados que validam ou melhoram os resultados do docking, o qual pode ser utilizado para interpretar melhor os dados fornecidos pelo método experimental. Algumas abordagens integradas podem, por exemplo, verificar a precisão do docking por meio da cristalografia, apurando e expandindo a base de dados e o algoritmo utilizados. Além disso, o desenvolvimento de fármacos baseados em estruturas pode ser melhorado a partir dessa integração, por possibilitar um estudo mais completo acerca das propriedades físico-químicas e estruturais da substância.


Mediante o conteúdo exposto, infere-se que o processo de desenvolvimento de medicamentos leva em consideração diversos fatores, os quais integram conhecimentos de áreas diversificadas. É importante avaliar cada aspecto por trás do processo produtivo, para garantir a segurança do paciente que fará uso do medicamento. 

Existem inúmeros métodos físicos e computacionais que oferecem um olhar mais geral acerca do desempenho de medicamentos mediante o contato com estruturas do organismo, conforme apresentado anteriormente. Contudo, apenas isso não é suficiente para prever a eficácia do tratamento de forma individual. É necessário avaliar a susceptibilidade particular de apresentar reações adversas ou falhas no tratamento antes de submeter o paciente a tal. 


O estudo das estruturas com as quais os medicamentos interagem, permite não só melhorar essas interações, mas prever possíveis mutações e polimorfismos que podem afetá-las.

Para isso, estudos relacionados a variabilidade na resposta a medicamentos em função da herança genética do paciente vem sendo desenvolvidos, os quais também integram princípios físico-químicos e computacionais. Isso é importante para melhorar a seguridade dos fármacos, reduzindo reações adversas, mortalidade e custo e desvendar mecanismos moleculares de doenças genéticas, facilitando a identificação de riscos para pacientes. 

A existência de polimorfismos no gene ocasiona diferentes fenótipos na metabolização de medicamentos. Além disso, variações genéticas em transportadores e alvos terapêuticos podem ter efeitos sobre a resposta do organismo a fármacos. Entender a estrutura das moléculas e suas propriedades físicas é imprescindível para identificar essas alterações estruturais e seus possíveis efeitos na biotransformação de fármacos. 


A integração de tais conhecimentos pode trazer inúmeras melhorias para a indústria farmacêutica, por levar em consideração diferentes aspectos por trás do desenvolvimento do medicamento e sua interação com o organismo. Futuramente, isso pode trazer muitos benefícios à saúde pública, trazendo novas alternativas de tratamentos mais seguros e eficientes, além da possibilidade de tratamento mais individualizado, focado nas necessidades e particularidades de cada paciente, o que ainda representa um desafio para a medicina, por conta dos obstáculos financeiros e éticos por trás de sua implementação. 




REFERÊNCIAS: 


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PESSOA, Renata, NÁCUL, Flávio, FRANÇOIS, Noel.. Farmacogenética e farmacogenômica: evidências de como a genética pode influenciar a eficácia de fármacos. Infarma: Revista de Ciência e Tecnologia Farmacêutica, São Paulo, v. 18, n. 11/12, p. 41-48. 2006.


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