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Foto do escritor Cailane Gois

Eu não deveria estar aqui


Por Flávia Avena


Qual é a correlação entre minorias sociais, STEM e a Síndrome do Impostor?


“Por trás de cada mulher que conquista novos lugares com poucos ou nulos referenciais, a chance de tudo isso vir acompanhado de culpa e vulnerabilidade cresce em proporções alarmantes.” – Luiza Brasil


A citação acima, escrita pela premiada jornalista e ativista racial para sua coluna na Revista Glamour, é um perfeito resumo de como mulheres de sucesso, sobretudo mulheres negras, têm de lidar com os efeitos emocionais atrelados às suas conquistas – é a chamada Síndrome do Impostor.


Antes de tudo: o que é a Síndrome do Impostor?

Apesar do nome, a Síndrome do Impostor não é, de fato, uma síndrome ou doença mental diagnosticada, mas sim uma desordem psicológica. Pessoas atingidas por esse distúrbio duvidam de suas próprias capacidades e acreditam que são uma fraude, que não são de fato inteligentes ou competentes e que suas conquistas decorreram meramente do acaso.

Foram as psicólogas estadunidenses Pauline Rose Clance e Suzanne Imes que, em 1978, criaram este conceito e o atrelaram a mulheres que acumulam conquistas acadêmicas e profissionais.


Síndrome da Impostora

“Quando uma mulher fracassa em algo pensa que não tem valor e, se triunfa, pensa que teve sorte. Quando os homens fracassam, por outro lado, têm uma lista de desculpas, seja um chefe rígido e que há uma crise mundial. Os homens externalizam o fracasso e as mulheres externalizam o sucesso” – Élisabeth Cadoche, autora do livro A Síndrome da Impostora

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“Vivemos em uma sociedade machista e racista” é uma afirmação batida, mas que, infelizmente, necessita de ser repetida, pois inúmeras problemáticas são resultantes desse fato. Com a Síndrome do Impostor – ou melhor, da Impostora – não poderia ser diferente: mulheres, em especial mulheres negras, têm de constantemente provar serem competentes no que fazem e justificar o mérito das posições que ocupam, o que leva a uma autocobrança excessiva e à sensação de que não deveriam estar onde estão. Porque, no fim das contas, elas não deveriam. Afinal, espaços de prestígio, de liderança e de intelecto foram por anos exclusivos para homens brancos e, até hoje, são protagonizados por esse grupo social. Quando uma mulher negra, portanto, alcança uma posição que “não foi feita” para ela, é quase natural que a sensação de não pertencimento e o sentimento de impostora venham à tona, frutos de uma internalização de ideias preconceituosas e inverossímeis.


STEM + Síndrome do Impostor

O que as quatro palavras que formam o acrônimo STEM têm em comum? Além de estarem atreladas a carreiras de exatas, também são unidas pelo preconceito racial e de gênero.

“No mundo todo, há poucas mulheres nas áreas de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM, das iniciais em inglês). Nas universidades, as mulheres representam apenas 35% dos alunos matriculados nesses campos – o percentual é ainda menor nas engenharias (de produção, civil e industrial) e em tecnologia, não chegando a 28% do total” – ONU Mulheres, 2019.


Apesar do aumento de protagonismo feminino nas últimas décadas e da criação de ações afirmativas que visam a tornar a ciência mais diversa, é nítido que carreiras em STEM continuam dominadas pelo sexo masculino e por pessoas brancas. Por conta disso, o meio acadêmico é altamente propício para o surgimento de dúvida, insegurança e exagerada autocrítica nas raras mulheres (e ainda mais raras mulheres negras) que o ocupam e que nele ganham destaque.

A consequência da Síndrome do Impostor nas citadas minorias no STEM é a intensificação dos abismos sociais e o aumento da exclusão. A constante necessidade de se provarem capazes, as duras cobranças e os preconceitos, dentre tantos outros desafios, levam a uma exaustão psicológica que, com frequência, pode ocasionar a desistência e a evasão da carreira acadêmica. Assim, permanece o mito de que mulheres não foram feitas para serem cientistas, o que corrobora com a persistência da baixa representatividade em áreas de STEM.


Talvez não devêssemos estar aqui – mas estamos e merecemos estar!

Como não estou fazendo uma dissertação argumentativa para vestibular, venho aqui quebrar um pouco as regras ao falar em primeira pessoa. Eu demorei muito para começar a escrever esse texto, não por procrastinação ou por não saber o que falar – mas sim por medo e dúvida. Será que o tema é pertinente? Será que vou saber me expressar corretamente? Já existem tantos artigos e tantas opiniões sobre o assunto, será que o que eu tenho a dizer vai agregar em alguma coisa? E se eu não souber de verdade do que estou falando? E se o problema da Síndrome do Impostor em mulheres no STEM nem existir, e se for só uma besteira sem importância?

Pois é.

A verdade é que ser mulher é um desafio diário. Quase consigo ver homens revirando os olhos e escutar comentários misóginos diminuindo e criticando o que escrevi – e, apesar de isso ser apenas minha imaginação, é uma representação de várias situações similares e reais que já testemunhei, pelas quais já passei e que ainda vou enfrentar enquanto mulher, escritora e (futuramente) cientista.

Porque eu não deveria ocupar esses espaços. Porque eu não deveria estar aqui. Porque nós, mulheres, não deveríamos estar aqui.

Bom, mas estamos.

Contra todas as expectativas, apesar de todas as dificuldades.

Estamos aqui.

E isso diz muita coisa.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS






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